terça-feira, 14 de abril de 2009

A simplicidade virou regra do jogo

A indústria dos videogames já se firmou como um dos maiores ramos de negócio do mundo. Milhões de consumidores e dólares giram em torno desse mercado e cada vez mais empresas querem tirar uma fatia do bolo. Porém, os games que conhecíamos nos anos 90 passaram por uma transformação radical neste século, especialmente com o advento de novas tecnologias e popularização do combo PC+Internet. O que antes era restrito a fabricantes de 3 consoles hoje expandiu-se para as mais diferentes mídias possíveis, algo fundamental para o crescimento do setor mas que também acabou por escancarar o real tamanho - e viabilidade - do negócio videogame.

Não acho que cabe aqui estabelecer um ponto inicial dessa mudança, mas creio ser fácil entender que ela gira em torno da massificação do portátil Nintendo DS, da queda de preço e popularização do Playstation 2 e, principalmente, do crescimento de novas plataformas de jogos, como PC e telefones celulares. Esses fatores, cada um do seu jeito, trouxeram novos consumidores para a mesa de negociação. Consumidores esses que não viveram o boom dos anos 90 e que, muitas vezes, não possuíam a bagagem cultural do ‘clássico’ jogador de games.

Essa variedade maior de plataformas e público exigiu novas idéias por parte das produtoras, já que o apetite do mercado pedia novos sabores de diversão. Sabores mais simples, mais acessíveis e especialmente adaptados para o meio no qual seriam consumidos. Um jogo de celular, por exemplo, não pode ter 10 horas de duração e controles complexos. Por outro lado, espera-se uma aventura épica em um jogo de US$100 milhões para Xbox 360. Então como equilibrar essa balança?

Difícil, para dizer o mínimo. Quanto mais o tempo passou, o público novato foi ficando mais importante e ávido por consumir. Surgiram, então, produtoras especializadas em jogos chamados casuais. Mas não estou falando do casual como algo simples ou bobo e sim como um game de consumo rápido e em doses menores. Algo que dê para jogar na fila do banco, no trem a caminho do trabalho, no intervalo da escola e por aí vai.

Aliás, a demanda por esse gênero de games não existe apenas pela ‘falta de capacidade’ do novo jogador. O que ocorre é que o publico cativo dos games e que passa horas na frente da TV jogando é muito especializado e representa pouco do mercado em geral. A maioria das pessoas que tem certo gosto por games também possui outras atividades como filhos, trabalho e lazer, sem contar os diferentes tipos de mídia com as quais o videogame rivaliza, como cinema, música, shows e, principalmente, a internet e suas comunidades virtuais.

A chegada da nova geração de consoles caseiros trouxe o que, na minha opinião, foi o calcanhar de aquiles das empresas do ramo: a quase obrigatoriedade de produzir games fantásticos e de alto valor de produção. Afinal, aquele público cativo que citei espera nada menos do que o melhor quando compra um novo console. Porém, ele ainda representa muito pouco da população potencialmente interessada em jogos eletrônicos e o custo de produção de um game de porte épico começou a exceder a massa crítica de vendas.

O termo massa crítica usado aqui refere-se à quantidade de pessoas que precisam comprar um jogo para que o custo de produzi-lo valha a pena - em outras palavras, seja coberto e, com sorte, ainda sobre alguma coisa como lucro. E isso não vem acontecendo com boa parte das empresas de games já há um bom tempo. Como é que muitas delas resolveram esse desequilíbrio nas finanças? Investindo pesado no mercado expandido, nos jogos para portáteis como o DS e celulares e, mais recentemente, para o Wii e iPhone.

(Falando de iPhone, apenas como um comentário interno ao artigo: o celular da Apple já passou da marca de 6000 jogos disponíveis na loja online. Muita porcaria? Claro, boa parte é mesmo, como em qualquer ramo de entretenimento. Mas há coisas muito boas e os desenvolvedores estão voltando seus olhos para o iPhone e investindo em equipes especializadas no aparelho.)

Há uma clara diferença entre jogo ruim e jogo acessível. Realmente existem muitas produtoras que estão soltando jogos pelo ralo na esperança de enganar o consumidor e ganhar um troco fácil com produtos de baixíssima qualidade. Mas isso não dura muito pois mesmo o público não sendo especialista no assunto ele está aprendendo a avaliar melhor suas compras e saberá reconhecer esse tipo de game com o passar do tempo. O melhor, para empresas que apostam no futuro, é oferecer opções casuais de qualidade e com conteúdo.

Nem de longe acho que a indústria está mudando a ponto de perdermos os ícones do passado. Aliás, o crescimento de plataformas acessíveis ajuda e muito a apresentar games tradicionais para esses novos jogadores. Mario Kart no DS e Wii, Metal Gear no iPhone, jogos de tiro no PC com Team Fortress 2, por exemplo. Enxergo isso como uma enorme chance de cultivar os consumidores do futuro para que eles tenham a curiosidade de ir além do Peggle, explorar mais do que Picross e querer ver outra coisa além de Super Monkey Ball.

É impossível negar a força dos games mais acessíveis e das novas plataformas para os mesmos. A Nintendo apostou certinho quando imaginou o Wii e DS e esses produtos seguem a filosofia da empresa. Brigar por potencial gráfico é arriscado e você sempre dependerá do enorme apoio que sua base de fãs precisará suprir ao seu console. GTA IV vendeu 13 milhões de cópias até o momento. Bastante, não? Pois bem, a Take Two, produtora da série, anunciou perdas no ano passado - não tão elevadas é verdade, mas o suficiente para mostrar que um andorinha só não faz verão. Curiosamente uma das séries de maior sucesso para a empresa recentemente é a Carnival Games (para Wii e DS). Jogos casuais sim, mas de qualidade e com ótimo fator de diversão.

Além de tudo isso, é preciso lembrar que a competição está maior do que nunca. As novas plataformas não só trouxeram um público diferenciado mas também abriram espaço para produtoras pequenas, caseiras e às vezes compostas de uma só pessoa. World of Goo e Audio Surf, por exemplo, dão um banho de originalidade e talento em muita empresa peso-pesado da indústria e nós só temos a ganhar com isso. Tomara que novos jogos maduros e épicos venham, mas tomara também que a criatividade tenha mais espaço nos cronogramas das produtoras.

Será preciso encontrar o melhor equilíbrio entre games de alta produção e produtos mais acessíveis de qualidade e valor agregado. O grande game nunca foi, e nunca será aliás, aquele com a maior verba. E hoje mais do que nunca ele está se provando extremamente oneroso para seus criadores podendo até quebrar uma empresa antes sólida e rentável.

A tranformação já começou - a revolução, em termos de Nintendo. Mas o melhor é que não será preciso escolher um lado; nós, como consumidores, sempre teremos à nossa disposição os frutos da competição sadia, do esforço para encontrar novos caminhos e da genialidade dos mestres dos games. Que venha o futuro!

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