sexta-feira, 27 de junho de 2008

Green Archive - Retro Reviews

Título: Star Wars
Produtora: Namco
Fabricante: Namco
Ano: 1987
Categoria: plataforma
Número de jogadores: 1
Análise por: Leonardo “Corredor X” Vinícius.

O Jogo:
Sob vários aspectos, 1977 foi um ano soberbo para a cultura de massa, do punk rock inglês ao Atari 2600, do Apple II a John Byrne desenhando os X-Men. Nenhum evento ocorrido naquele ano, entretanto, consegue se igualar em influência ao lançamento de um então desacreditado filme. Definido por seu criador George Lucas como uma ópera espacial e reunindo influências que iam de Fritz Lang a Joseph Campbell, passando por Akira Kurosawa e velhos serials de aventura, Guerra nas Estrelas tornou-se um dos maiores fenômenos culturais da história. Por conta disso, a saga dos cavaleiros jedi não se restringiu às duas trilogias de cinema, desembocando em praticamente todos os meios possíveis e disponíveis: literatura, desenhos animados, quadrinhos, novelas de rádio, brinquedos, álbuns de figurinhas, vestuário, música e, na vertente que mais nos interessa aqui, jogos de videogame.



Desde o lançamento de The Empire Strikes Back em 1983 para o Atari, os entusiastas da série tiveram acesso a uma infinidade de títulos da franquia Star Wars para seus consoles e computadores, além de alguns inesquecíveis arcades. Tivemos jogos de plataforma, luta, tiro, estratégia, corrida, RPG, MMORPG e até um de xadrez, creiam ou não. Alguns desses acabaram se tornando clássicos de suas plataformas, como os diversos simuladores de X-Wings e TIE Fighters do PC, a trilogia do Super Nintendo, os sensacionais Knights Of The Old Republic e os divertidos Lego Star Wars – o que abrange a Trilogia Clássica me fez largar o controle de tanto rir na cena da revelação da paternidade do Episódio V. Como fã tanto dos filmes quanto dos jogos derivados deles, imaginava conhecer praticamente tudo o que valia a pena ser jogado em termos de Guerra Nas Estrelas. Até descobrir uma pérola escondida…
Após alguma pesquisa e diversos depoimentos, descobrimos que a versão de Famicom, a qual nunca eu vira antes, é realmente diferente da produzida pela JVC para sua contraparte americana. A japonesa foi feita por outra produtora, a Namco - quatro anos antes do cartucho do NES, num longínquo 1987. Preso a minha crença inabalável de que os sujeitos que nos deram Pac-Man, Soul Calibur, Katamari Damacy e Tales Of Phantasia não me decepcionariam, lá fui eu testar despretensiosamente a ROM do jogo. Sinceramente, não estava preparado para o que meus olhos presenciariam…



Em termos gerais, Star Wars não difere muito de seu primo do NES: um típico jogo de plataforma, na qual o jogador controla Luke Skywalker, um garoto cuja vida simples toma rumos inesperados ao se ver envolvido com rebeldes dispostos a derrubar o maligno Império Galáctico. Entre os estágios, o jogador deve controlar a famosa nave Millennium Falcon, na perspectiva de primeira pessoa, tendo que destruir um número de inimigos imperiais para avançar ao próximo planeta. Como veremos adiante, a grande diferença entre as duas versões fica por conta da adaptação da história do filme feita em cada uma. A versão mais conhecida do console já cometia algumas liberdades em relação ao enredo original em prol da jogabilidade, mas o belo cartucho prateado do Famicom subverte o rumo dos acontecimentos de uma maneira inacreditável. Os gráficos desta versão, por ter sido lançada alguns anos antes, são mais simples do que jogo do NES, mas não fazem feio se comparados a jogos similares da mesma época, como Metroid e Zelda II. Por falar nestes dois títulos, eles provavelmente exerceram grande influência na concepção deste Star Wars da Namco, como o jogador pode perceber ao avançar no jogo. Outra fonte de “influência”, para não dizer outra coisa, é um clássico do Master System, que citarei mais tarde…

Estão presentes aqui, na apresentação do jogo, o famoso letreiro ascendente e a cena da nave Tantive IV sendo perseguida por um destróier Imperial, que abrem o filme original. A trilha sonora é agradável, utilizando-se dos já conhecidos temas compostos por John Williams. Um detalhe muito curioso e que só os fãs perceberão é a inclusão, em um determinado momento, da Marcha Imperial (o famoso tema das aparições do vilão Darth Vader), que originalmente não aparece no primeiro filme da série, no qual o jogo é baseado.



Ao pressionarmos Start na tela de abertura, somos convidados a escolher entre os dois níveis de dificuldade possíveis: Novice e Pro. A diferença principal entre eles é a quantidade de inimigos, ligeiramente maior no segundo, mas que faz com que o jogo se torne sensivelmente mais difícil em determinados momentos. Outras particularidades do nível Pro são o número maior de naves nas fases intermediárias e a quantidade de Força reposta pelos diversos cristais deixados pelos inimigos. Sim, a Força, a energia mística manifestada pelos jedi, está presente aqui desde o seu início, uma das primeiras discrepâncias entre filme e jogo – afinal, Luke só vai entender melhor seus poderes em O Império Contra-Ataca. Sem contar que ele também já começa usando um sabre de luz que só deveria ganhar muito depois, mas isso são apenas detalhes que só fãs chatos como eu se sentem incomodados ao perceber. Em algumas fases, mediante achar o item correspondente, é possível também o uso de pistolas laser, que acertam os inimigos à distância.

Entre as façanhas que a Força permite a Luke, estão o aumento da velocidade, congelar o tempo, flutuar, voltar ao início da fase e até mesmo fazer o sabre de luz soltar raios! Não é realmente necessário o uso da maioria dessas habilidades, embora elas ajudem bastante em algumas ocasiões. No mesmo menu de poderes da Força, acessível ao pausar o jogo, estão ícones com os amigos que Luke já resgatou das garras do Império. Ao serem selecionados, apenas uma vez por fase, eles concedem algum benefício ao jogador, como reposição da Força, um conselho para derrotar o inimigo ou mesmo permitem a continuidade do jogo de alguma forma.



A jogabilidade em si é comparável aos títulos de plataforma da época, embora com alguns poréns. Luke tem a tendência de deslizar demais nas plataformas, geralmente pequenas e sujeitas a deixá-lo cair – isso quando não se desfazem em dois segundos ou um robô ou animal voador o intercepta no meio do pulo, coisas nada raras de acontecer. Como não há barra de energia, é menos uma vida – Luke começa com o jogo com três, podendo coletar algumas poucas pelo caminho, e não há continues. Outra coisa que periga irritar o jogador é o alcance limitado do sabre de luz, além da área de cobertura e velocidade do golpe. Isso fica evidente já no primeiro inimigo do jogo, que só é acertado caso Luke se abaixe. Algumas fases, principalmente a Estrela da Morte, são um pouco confusas e repetitivas, repletas de espaços inúteis. Já os estágios com a nave exigem bastante atenção, podendo ceifar uma importante vida por descuido. Todos esses fatores contribuem para que Star Wars seja um jogo bem difícil, mas não fazem dele nenhum Ghosts n’ Goblins. Acredito que um jogador veterano do NES, com uma boa dose de paciência, consiga terminá-lo.

O que escrevi até agora passaria por um review relativamente convincente do Star Wars da Namco. Eu estaria me traindo, entretanto, se não descrevesse uma série de detalhes que tornam esse jogo uma das coisas mais bizarras já vistas pela minha pessoa. Não recontasse uma história conhecida, este seria apenas um curioso jogo de plataforma japonês, tipo Daiku No Gen-San ou Castlevania Jr, embora sem o charme de ambos. Mas é justamente por usar elementos de uma das sagas mais famosas da cultura pop de uma maneira inusitada é que o dito surpreende. A seguir, alguns detalhes que o jogador que tem algum conhecimento dos filmes deve (e certamente vai) notar ao destrinchar este elo perdido. Que a Força esteja com você, nobre leitor:

Os personagens tem uma tendência estranha de mudar a cor de seus cabelos. Em todas as cenas extra-fase, Luke é loiro, mas quando pode ser controlado fica moreno! Já a Princesa Leia é curiosamente loira em todas as animações, incluindo seu holograma mostrado por R2-D2 na introdução, com seu cabelo se tornando castanho ao ser encontrada na Estrela da Morte.

Uso indiscriminado de Darth Vader. Sim, o cruel antagonista da série, que geralmente é o desafio maior dos outros jogos da franquia, é o chefe de todos os estágios! A cada nova aparição, ele se apresenta com um nome diferente: Sasori Vader, Gaos Vader, Kurado Vader e Wampa Vader, além de duas aparições com seu nome original. Não bastasse isso, ele ainda sofre uma transformação no estilo Altered Beast ao levar alguns golpes, tornando-se um monstro! A surpresa de ver o pobre vilão virar um escorpião gigante, wampa (a criatura que ataca e prende Luke no começo de O Império Contra-Ataca), tubarão e até um pterodáctilo que parece ter saído de um Joe & Mac ou Bonk é impagável, certamente arrancando gargalhadas dos fãs após o choque inicial. Aconteceu comigo, pelo menos! Ao morrer, Vader some em meio a uma suspeita fumacinha rosa…

Até subliminarmente o coitado do Darth está em excesso! Nas fases intermediárias, Luke destrói naves do Império. Mas em adição aos manjados Tie Fighters, as aeronaves mais comuns do primeiro filme, alguns inimigos pilotam o modelo exclusivo de Darth Vader, o advanced x1! Na versão da Namco, o Império não contra-ataca, ele apela!



Alguns inimigos são retirados diretamente dos filmes, como os stormtroopers e o Povo da Areia, mas não se assuste ao ver Luke enfrentando siris, coisas parecidas com sacos roxos, chupacabras e até tatus durante as fases. Sem contar os sapos, peixes, pássaros e os foguinhos ambulantes copiados na cara dura do clássico Alex Kidd In Miracle World do Master System! É impossível não notar a semelhança. Mas o troféu de inimigo mais impagável que Luke enfrenta sem dúvida vai para o peso de 16 toneladas. Sim, lembram-se daquele pesado quadrilátero, com a inscrição “16t”, que geralmente caia na cabeça do Patolino? Em plena base de Yavin, você encontra vários deles caindo do teto, podendo ser destruídos com um mísero tiro de laser.

Em comum com a história original, temos Luke saindo do planeta Tatooine, indo até a Estrela da Morte, depois para Yavin e de volta para a Estrela da Morte. Mas não era esse todo o enredo do filme, você pergunta? Bem, quando esses acontecimentos são entremeados por visitas ao planeta de gelo Tina, ao ambiente egípcio (sim, você leu direito) de Kessel e ao mundo aquático de Iscalon, a coisa muda um pouco de figura. Mais sobre cada um desses estranhos lugares mais abaixo… Sem contar que a ida em cada planeta tem o objetivo de salvar um de seus amigos (sendo que Luke só passa a conhecê-los mediante seus pedidos de socorro), que entram na história muito tempo depois do que deveriam! Por exemplo, Han Solo é o último amigo a ser resgatado, um sem-número de fases depois de Luke ter conseguido a Millennium Falcon, que pertence a Han. Ou seja, Luke simplesmente a roubou do porto espacial no começo do jogo! Ora, nem precisa ir muito longe: Obi-Wan Kenobi só se apresenta a Luke na segunda fase, sendo que originalmente foi o velho mestre que colocou o garoto nessa aventura e pediu para ele conseguir algum transporte. Ou seja, além de ter roubado a Falcon, Luke ainda o fez sem motivo algum!

Por falar nos amigos de Luke, cada um tem um jeito particular de agradecer seu salvamento nas cenas intermediárias. Obi-Wan balança as mãos do garoto, Han dá tapinhas nas costas, Leia abraça e beija e Chewbacca… Bem, posso garantir a vocês que a crise de riso que tive ao ver o grande e peludo wookie tascar um beijo em Luke conseguiu ser ainda maior do que ao ver Sasori Vader virar escorpião. São coisas assim que fazem esse jogo ser único.



Kessel, o planeta montanhoso. É aqui que o jogo começa oficialmente a ficar estranho. A fase se inicia normalmente, com os sapos e pássaros do Alex Kidd, mas logo um observador mais atento percebe blocos com rostos egípcios, estátuas do deus-crocodilo Sobek e sarcófagos. Não demora muito para se encontrar um castelo azul (ligeiramente parecido com o de Radactian, também de Miracle World), na qual enfrentamos Gaos Vader sob uma gigantesca máscara mortuária do faraó Tutankhamon.

Iscalon, o planeta aquático. Logo na tela inicial, Luke e sua máscara de mergulho dão de cara com a sede do Governo dos Estados Unidos, o Capitólio, submerso. Mas o choque inicial logo se vai quando a semelhança com os momentos de natação de Alex Kidd se tornam gritantes. Até o comportamento daquele peixe esquisito é igual! Quem também faz participação especial aqui são as erráticas lulas de Super Mario Bros. E enfrentar Vader debaixo d’água também é digno de nota.

Tina, o planeta de gelo. Não, não é o Hoth de O Império Contra-Ataca, é Tina mesmo, com direito até a uma baleia soltando água no fundo da fase. Além de cavernas que poderiam muito bem fazer parte do primeiro Metroid, temos aqui o momento Zelda II do jogo. Em determinado momento, um estranho personagem chamado Mombanda (é, o nome é esse mesmo) impede a passagem de Luke, dizendo qualquer coisa naquele conhecido estilo me Tarzan you Jane. Qualquer um que já tenha tentando acordar a segunda Zelda, ao ver o tal sujeito, imediatamente imagina que ele irá dizer algo como IF ALL ELSE FAILS USE FIRE ou I AM ERROR.

Em quantos jogos de Guerra Nas Estrelas o temível caçador de recompensas Boba Fett, que nem aparece no filme no qual este jogo (teoricamente) é baseado, é um inimigo comum que aparece preso em celas atirando em você, às vezes até duplicado? É só no Famicom, meu amigo!

A última fase, em visão superior e em que Luke pilota a X-Wing, é de arrancar os cabelos. No corredor da Estrela da Morte, num estágio que lembra sua contraparte da versão mais conhecida do jogo para NES, você corre contra o tempo (60 segundos) para alcançar o local de fazer o disparo certeiro. Deve-se ir o mais rápido possível aqui, atirando em naves, desviando de paredes e pegando itens que repõem um pouco do contador de tempo. Dois detalhes curiosos: o primeiro é que, após uma batida, é comum o jogo mandar a nave reserva para o centro da tela, onde com freqüência aparecem paredes que te fazem perder outra vida, direto. O outro é o fato de que o Game Over aqui não mostra mais o rosto de Vader, mas sim a Estrela da Morte explodindo Yavin, seguida pela Marcha Imperial de trilha sonora! Esta é definitivamente a fase mais difícil do jogo, já que todas as suas vidas podem acabar em segundos, literalmente.

A única diferença entre os níveis Novice e Pro no tocante à cena final é quem recebe as medalhas de honra, na mesma cerimônia do filme. O do nível Novice, por sinal, corrige uma pequena injustiça da cena original, que os fãs mais dedicados (provavelmente os únicos a chegar até aqui!) perceberão.

Embora aparentemente esses detalhes não influenciem em nada na jogabilidade, foram eles que me mantiveram pregado no Star Wars da Namco até o fim. Não fosse esse inacreditável festival de “liberdades” cometido em cima de uma das minhas sagas favoritas, comparável ao apócrifo Star Wars Holiday Special, eu provavelmente nunca teria sequer ligado para ele. Quem não tem muita intimidade com os filmes ou nasceu quando os videogames já tinham memory cards vai encontrar apenas um jogo mediano, que não envelheceu tão bem em comparação com Castlevania e Megaman, por exemplo – sem contar o desafio, que pode irritar em alguns pontos. Apesar disso, vale a pena ao menos experimentar esta preciosidade esquecida pela história, de preferência burlando a barreira do japonês com um patch para o inglês facilmente encontrado na internet. Nem que seja para rir um pouco e se perguntar: como George Lucas autorizou isso?

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